“CRISTO,
NOSSA PÁSCOA, FOI SACRIFICADO POR NÓS” (1Corintios 5:7)
O apóstolo Paulo, em sua primeira Epístola aos Coríntios, capítulo 5, versículo 7, proclama: "Cristo, nossa Páscoa, foi sacrificado por nós". Essa declaração carrega consigo uma profundidade teológica e simbólica. Qual o significado por trás dessa afirmação, considerando suas implicações históricas, teológicas e práticas para a fé cristã?
A
Páscoa no Antigo Testamento: Uma Sombra da Redenção Vindoura
Para
entendermos Cristo como nossa Páscoa, precisamos primeiro olhar para a
celebração original da Páscoa no Antigo Testamento. O livro de Êxodo, capítulo
12, narra a instituição dessa festa durante a décima praga que assolou o Egito.
Deus enviou um anjo da morte para ferir os primogênitos de cada família
egípcia. No entanto, as famílias israelitas foram instruídas a sacrificar um
cordeiro sem defeito e a passar o seu sangue nos umbrais das portas de suas
casas. Esse sangue seria um sinal para que o anjo da morte "passasse por cima" (em hebraico,
"pasach") daquela casa, poupando o primogênito.
Essa
primeira Páscoa marcava a libertação do povo de Israel da escravidão no Egito,
um evento crucial na história da salvação. A celebração envolvia:
- O
sacrifício do cordeiro:
Um animal puro e sem mácula, cujo sangue trazia proteção.
- O pão
ázimo (sem fermento):
Simbolizava a pressa da partida e a ausência de impureza.
- As
ervas amargas:
Recordavam a amargura da escravidão.
- Uma
refeição comunitária:
Celebrada em família, fortalecendo os laços e a memória da intervenção
divina.
Essa
Páscoa anual se tornou um memorial da redenção de Deus, lembrando a Israel que
Ele os havia tirado da morte para a liberdade. No entanto, como Paulo escreve
em Colossenses 2:16-17, essas práticas do Antigo Testamento eram "sombras
das coisas que haviam de vir; mas o corpo é de Cristo".
Cristo, o Nosso Cordeiro Pascal: O Cumprimento da Promessa
No
Novo Testamento, a figura de Jesus Cristo é apresentada como o cumprimento
definitivo do significado da Páscoa. Em 1 Coríntios 5:7, o apóstolo Paulo
declara: "Porque Cristo, nossa Páscoa, já foi sacrificado por nós."
Essa afirmação revela uma conexão profunda e essencial:
- Jesus
como o Cordeiro Perfeito:
Assim como o cordeiro pascal do Antigo Testamento era sem defeito, Jesus
Cristo, o "Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo" (João
1:29), é o sacrifício perfeito e imaculado. Sua vida sem pecado e sua
morte na cruz oferecem a propiciação pelos pecados da humanidade.
- O
Sangue da Nova Aliança:
O sangue do cordeiro pascal trouxe libertação da morte física no Egito. O
sangue de Jesus, derramado na cruz, oferece libertação da morte espiritual
e eterna, selando a Nova Aliança entre Deus e a humanidade (Lucas 22:20).
- A
Passagem da Morte para a Vida:
A Páscoa celebrava a passagem da escravidão para a liberdade. Em Cristo,
experimentamos a passagem da morte para a vida eterna através de sua
ressurreição. Ele venceu a morte e o pecado, oferecendo-nos uma nova
esperança e um novo começo (Romanos 6:4).
- O Novo
Pão Ázimo: Paulo
exorta os coríntios a se livrarem do "velho fermento" da maldade
e da malícia e a celebrarem a festa com os "pães ázimos da
sinceridade e da verdade" (1 Coríntios 5:8). Isso nos lembra que, em
Cristo, somos chamados a viver uma vida purificada do pecado.
A
Celebração da Nova Páscoa
Para
os cristãos, a Páscoa não é apenas uma lembrança de um evento histórico, mas
uma celebração viva da vitória de Cristo sobre o pecado e a morte. A
ressurreição de Jesus, que ocorreu durante a época da Páscoa judaica, é o ponto
central da fé cristã. Ela demonstra o poder de Deus sobre a morte e garante a
nossa própria ressurreição e vida eterna.
Assim,
quando celebramos a Páscoa hoje, lembramos e agradecemos o sacrifício supremo
de Jesus, o nosso Cordeiro Pascal. Sua morte e ressurreição nos trouxeram a
verdadeira libertação da escravidão do pecado e nos abriram o caminho para a
comunhão com Deus e a vida eterna. A Páscoa cristã é, portanto, um tempo de
profunda reflexão, gratidão e alegria pela obra redentora de Cristo em nossas
vidas.
Contextualização histórica e Bíblica da Páscoa
Para
compreender plenamente o significado de Cristo como nossa Páscoa, é essencial
entender as raízes históricas e bíblicas da festa da Páscoa. A Páscoa judaica
remonta à libertação do povo hebreu do Egito, conforme registrado no livro do
Êxodo, aproximadamente em 1445 a.C. Essa celebração anual tinha como base as
leis estabelecidas por Yahweh, incluindo rituais específicos como a imolação do
cordeiro pascal e a aspersão de seu sangue nas portas das casas, conforme
instruído em Êxodo 12:23.
O
nome "Páscoa" deriva do verbo hebraico "Pesah", que
significa "passar por cima", em referência à proteção concedida às
casas marcadas com o sangue do cordeiro pascal contra a praga da morte durante
a última das dez pragas do Egito.
A partir da instituião da Páscoa, no
Egito, o povo de Deus ia celebrar a Páscoa toda primavera, obedecendo as
instruções divinas de que aquela celebração seria "estatuto
perpétuo" (Êxodo
12:14). Era, porém, um sacrifício comemorativo, exceto o sacrifício inicial
no Egito, que foi um
sacrifício eficaz.
Antes da construção do templo em
Jerusalém, em cada Páscoa os israelitas reuniam-se segundo suas famílias, sacrificavam um cordeiro,
retiravam todo fermento de suas casas e comiam ervas amargas. Mais importante:
recontavam a história de como seus ancestrais experimentaram o êxodo milagroso
na terra do Egito e sua
libertação da escravidão ao Faraó. Assim, de geração em geração, o povo hebreu
relembrava a redenção divina e seu livramento do Egito (Êxodo 12:26).
Uma vez construído o templo, Deus ordenou
que a celebração da Páscoa e o sacrifício do cordeiro fossem realizados em
Jerusalém (Dt.16:1-6). O
Antigo Testamento registra várias ocasiões em que uma Páscoa
especialmente relevante foi celebrada na cidade santa (2Cronicas 30:1-20; 35:1-19; 2Reis 23:21-23; Eadras 6:19-22).
Nos tempos do Novo Testamento, os judeus
observavam a Páscoa da mesma maneira. O único incidente na vida de Jesus como
menino, que as Escrituras registram, foi quando seus pais o levaram a
Jerusalém, aos doze anos de idade, para a celebração da Páscoa (Lucas 2:41-50). Posteriormente, Jesus
ia cada ano a Jerusalém para participar da Páscoa (João 2:13). A última Ceia de que
Jesus participou com os seus discípulos em Jerusalém, pouco antes da cruz, foi
uma refeição da Páscoa (Mateus 26:1,2,17-29). O próprio
Jesus foi crucificado na Páscoa, como o Cordeiro pascoal (cf. 1Corintios 5:7) que liberta do pecado
e da morte todos aqueles que nele crêem.
Hoje, os judeus continuam celebrando a
Páscoa, embora seu modo de celebrá-la tenha mudado um pouco. Posto que não
existe em Jerusalém um templo para sacrificar um cordeiro, em obediência a Dt.16:1-6, a festa judaica
contemporânea (chamada Seder) já não é celebrada com o
cordeiro assado. Mas as famílias ainda se reúnem para a solenidade e, no
momento da cerimônia, o pai da família narra toda a história do êxodo.
A
Páscoa e Jesus Cristo
Paulo,
ao proclamar que Cristo é nossa Páscoa (1Corintios 5:7), estabelece uma conexão
profunda entre os eventos da Páscoa judaica e o sacrifício redentor de Jesus na
cruz. Assim como o cordeiro pascal foi imolado para proteger o povo hebreu da
morte, Jesus foi sacrificado para redimir a humanidade do poder do pecado e da
morte.
O Novo Testamento ensina explicitamente
que as festas judaicas "são sombras das coisas
futuras" (Col.2:16,17; Hb.10:1), isto é, a redenção
pelo sangue de Jesus Cristo. Note os seguintes itens em Êxodo 12, que nos fazem lembrar
do nosso Salvador e do seu propósito para conosco (extraído e adaptado da Bíblia de Estudo Pentecostal):
O âmago do evento da Páscoa era a graça
salvadora de Deus. Deus tirou os israelitas do Egito, não porque eles eram
um povo merecedor, mas porque Ele os amou e porque Ele era fiel ao seu concerto
(Dt.7:7-10). Semelhantemente,
a salvação que recebemos de Cristo nos vem através da maravilhosa graça de Deus
(Ef.2:8-10; Tt.3:4,5).
O propósito do sangue aplicado às vergas
das portas era salvar da morte o filho primogênito de cada família; esse
fato prenuncia o derramamento do sangue de Cristo na cruz a fim de nos salvar
da morte e da ira de Deus contra o pecado (Ex.12:13,23,27; Hb.9:22).
O cordeiro pascoal era um
"sacrifício" (Ex.12:27) a servir de
substituto do primogênito; isto prenuncia
a morte de Cristo em substituição à morte do crente (ver Rm.3:25). Paulo expressamente chama Cristo nosso
Cordeiro da Páscoa, que foi sacrificado por nós (1Co.5:7).
O cordeiro macho separado para morte
tinha de ser "sem mácula" (Ex.12:5); esse fato prefigura a
impecabilidade de Cristo, o perfeito Filho de Deus (João 8.46; Hb.4:15).
Alimentar-se do cordeiro
representava a identificação da comunidade israelita com a morte do cordeiro,
morte esta que os salvou da morte física (1Co.10:16,17;
11;24-26). Assim como no caso da Páscoa, somente o sacrifício
inicial, a morte dele na cruz, foi um sacrifício eficaz. Realizamos em
continuação a Ceia do Senhor como um memorial, "em memória"
dEle (1Co.11:24).
A aspersão do sangue nas vergas das
portas era efetuada com fé obediente (Ex.12:28; Hb.11:28); essa obediência pela
fé resultou, então, em redenção mediante o sangue (Ex.12:7,13). A salvação mediante o
sangue de Cristo se obtém somente através da “obediência da fé” (Rm.1:5; 16:26).
O cordeiro da Páscoa devia ser comido
juntamente com pães ásmos (Êxodo
12:8). Uma vez que na Bíblia o fermento normalmente simboliza o pecado e a
corrupção (Ex.13:7; Mt.16:6; Mc.8:15), esses pães ásmos representavam a separação entre os
israelitas redimidos e o Egito,
isto é, o mundo e o pecado. Semelhantemente, o povo redimido por Deus é chamado
para separar-se do mundo
pecaminoso e dedicar-se exclusivamente
a Deus.
Cumprimento
profético em Cristo
A
vida, morte e ressurreição de Jesus são interpretadas à luz das Escrituras como
o cumprimento do plano redentor de Deus para a humanidade. Ele é retratado como
o "Cordeiro de Deus que tira o pecado do
mundo" (João 1:29), uma alusão clara ao cordeiro pascal cujo sangue
salvou os israelitas da morte.
O
Sacrifício expiatório de Cristo
A
imagem do cordeiro sacrificado na Páscoa judaica é ampliada e aprofundada na
obra redentora de Cristo. Ele é retratado como o sacrifício perfeito, cujo
sangue derramado na cruz expia os pecados da humanidade, conforme expresso em
Hebreus 9:22: "sem derramamento de sangue não
há perdão".
A
Ceia do Senhor como cumprimento da Páscoa
A
Ceia do Senhor, também conhecida como Santa Ceia, é o memorial instituído por
Jesus para recordar seu sacrifício e celebrar a comunhão dos crentes com Cristo
e entre si. Ela assume o lugar da Páscoa judaica, transformando seu significado
e apontando para a realização final em Cristo.
Significado
simbólico da Ceia do Senhor
- O
Corpo de Cristo: O
pão partido na Ceia simboliza o corpo de Cristo dado em sacrifício por
nós, como mencionado por Paulo em 1Coríntios 11:24.
- O
Sangue de Cristo: O
vinho da Ceia representa o sangue de Cristo derramado para a remissão dos
pecados, conforme ensinado por Jesus durante a última Ceia (Lucas 22:20).
- Nova
Aliança: Assim como a
Páscoa representava a antiga aliança, a Ceia do Senhor nos lembra da nova
aliança estabelecida por Cristo através de seu sacrifício (Lucas 22:20).
Portanto, o cordeiro pascal foi substituído na Ceia cristã pelo
pão, e o sangue do cordeiro pelo vinho, símbolo do sangue de Jesus. Então,
podemos definir qual é o significado da Ceia do Senhor: ela simboliza o supremo
dom do amor de Deus em Jesus, que entregou seu próprio corpo e derramou seu
sangue em nosso lugar para nos perdoar os pecados.
Porém,
é válido lembrar que o traidor também estava participando dessa celebração:” a mão do traidor está comigo à mesa”
(Lc.22:21). Quem era ele? Jesus sabia, mas não contou. Lucas 22:23 diz que a
ansiedade tomou conta de todos os que participavam daquele momento - “serei eu? Será você? Quem vai trair Jesus e o
evangelho?”, indagaram os discípulos entre si. Que nós não traiamos Jesus de
maneira nenhuma, mas nos disponhamos, se preciso for, até a morrer anunciando a
nova vida que Ele dá.
Universalidade
da Redenção em Cristo
Enquanto
a Páscoa judaica tinha um foco nacional e étnico, a Ceia do Senhor é celebrada
por todos os crentes, independentemente de sua origem ou nacionalidade. Ela
simboliza a redenção universal oferecida por Cristo a toda a humanidade, como
proclamado em João 3:16: "Porque Deus amou o
mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que
nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. Além de seu profundo
significado teológico, a compreensão de Cristo como nossa Páscoa tem
implicações práticas para a vida cristã e a experiência pessoal de salvação.
Libertação
do pecado e da morte
Assim
como a Páscoa judaica representava a libertação do povo hebreu do cativeiro
egípcio, a Páscoa em Cristo simboliza nossa libertação da escravidão do pecado
e da condenação espiritual. Como afirmado por Jesus em João 8:36: "Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente
sereis livres".
Chamado
à santidade e gratidão
O
reconhecimento do sacrifício de Cristo como nossa Páscoa nos desafia a viver
vidas santas e gratas diante de Deus. Como Paulo exorta em Romanos 12:1: "Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que
apresenteis o vosso corpo como um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus,
que é o vosso culto racional".
Conclusão
A
afirmação de Paulo de que "Cristo, nossa
Páscoa, foi sacrificado por nós" encapsula a essência do evangelho
cristão. Ela nos lembra da obra redentora de Cristo na cruz, que cumpre e
transcende o simbolismo da Páscoa judaica, oferecendo salvação e vida eterna a
todos que creem. Que possamos viver em constante gratidão e adoração por esse
sacrifício inigualável.
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